Direito Imobiliário

1 Introdução

O crescimento desordenado dos centros urbanos brasileiros traz a tona uma triste realidade, a falta de regulação e organização, e a conseqüente exclusão social no que se refere a propriedade urbana, dificuldades geradoras de conflitos que anseiam por soluções urgentes, oriundas de políticas públicas eficazes e capazes de conter o avançado processo de marginalização, da degradação ambiental, alterando a estrutura urbana sucateada e por vezes inexistente.

A questão da terra, da moradia e da propriedade, tão debatida em nosso país, é ao mesmo tempo a origem e a solução para um problema que há muito gera conflitos, e é de tal forma importante, que a Constituição da república ao tratar dos direitos sociais traz nos artigos 6º e 7º, inciso IV, entre outros, direitos que visam a melhoria da condição social dos trabalhadores e entre esses direitos esta o direito à moradia.

Buscando cumprir preceitos constitucionais e solucionar a conturbada questão da moradia, definindo critérios e instrumentos que solucionem a questão da irregularidade urbana, foi criado o Ministério das Cidades, e em 2001, a Lei Federal 10.257, o Estatuto da Cidade, com definições e conceitos de propriedade urbana, objetivando a regularização fundiária no país, em 2009 foi promulgada a Lei 11.977 que ampliou e atualizou o conceito de regularização fundiária, trazendo novas definições e meios de efetivação do direito à moradia.

Visa o presente estudo apresentar em linhas gerais o conceito e a importância do direito à moradia enquanto direito fundamental, o conceito de regularização fundiária sua importância na busca da efetivação de um direito à moradia, os meios apresentados por algumas leis criadas com o objetivo de concretizar esse direito sócio/fundamental, transpondo mais um degrau que leva ao efetivo cumprimento do Princípio da Dignidade Humana..

 

2 O Direito a Moradia e a Constituição Federal de 1988

A Constituição Federal de 1988 trouxe muitas transformações em vários campos do direito, tanto no direito privado como no público, firmando-se como fundamento de validade de todo sistema jurídico do país. Passamos a ser um “Estado Democrático de Direito”, com uma Constituição que define e consagra os Direitos e Garantias Fundamentais, os Direitos Sociais, e que entre seus princípios norteadores, tem como principal o da “Dignidade da Pessoa Humana”.

A verdade é que embora não conste expressamente em nossa Carta Magna, a partir de 05 de outubro de 1988 passamos a ser um Estado Social e Democrático de Direito, graças aos direitos fundamentais e sociais nela elencados, assim se manifesta Sarlet, corroborando com o pensamento acima e a seguir transcrito:

 

Também a estreita ligação dos direitos fundamentais com o Princípio do Estado Social consagrado pela Constituição, na esteira da maior parte das Leis Fundamentais contemporâneas, merece destaque. Apesar da ausência expressa de norma expressa no direito constitucional pátrio qualificando nossa República como um Estado Social e Democrático de Direito (o art. 1º caput, refere apenas os termos democrático e Direito), não restam dúvidas... (SARLET, 2008, p. 62).

 

Entre os direitos fundamentais/sociais constitucionais encontramos o direito a moradia, incluído nesta quando a mesma já estava em vigor, pela Emenda Constitucional 26/2000 com a seguinte redação:

 

Art. 6º São direitos sociais, a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.

 

No artigo 7º, inciso IV, podemos confirmar o direito moradia, destacando que este já estava previsto no texto constitucional antes da Emenda 26/2000, ou seja, o direito a moradia de certa forma já existia entre os direitos sociais, sendo que o legislador apenas não o havia deixado expressamente claro.

Também na Declaração Universal dos Direitos Humanos encontramos reconhecido o direito à moradia no item I do artigo 25 que nos traz que “toda pessoa tem direito a um padrão de vida capaz de assegurar a si e a sua família saúde e bem estar, inclusive alimentação, vestuário, habitação... (grifo nosso), entre outros importantes direitos necessários a uma vida digna.

Temos então que o Direito a Moradia, tão almejado e buscado pelos homens desde os tempos mais remotos é um direito fundamental e, portanto como tal, diretamente ligado ao princípio da dignidade da pessoa humana. Para que possamos confirmar esta estreita ligação, basta que nos recordemos de alguns fatos históricos, como a busca do povo Hebreu pela terra prometida, descrita no livro do Êxodo, ou mesmo fatos mais recentes e ligados a nossa própria história, como a colonização do continente americano, ou a recente luta dos povos indígenas para serem mantidos em sua terra de origem.

Tais relatos vêm apenas confirmar a ligação entre moradia, ter um lar, e personalidade, moradia e dignidade, e porque não, a moradia e a própria história do indivíduo que nela habita, sendo, portanto, um direito de caráter extremamente subjetivo, o que fica muito bem definido nas palavras de Canotilho: “Os direitos sociais são compreendidos como autênticos direitos subjectivos inerentes ao espaço existencial do cidadão, independentemente da sua justicialidade e exeqüibilidade imediata”.  (2003, p. 476).

Conceituar moradia de forma correta é tarefa difícil e requer uma análise baseada em diversos pontos de vista:

  

A conceituação de moradia indigna pode ser facilmente extraída dos elementos insertos nos dados do déficit habitacional qualitativo. Contudo, seu conceito inverso é bem mais tormentoso e exige um esforço interpretativo e conseqüente que leve em consideração os elementos jurídicos, sociais, culturais e financeiros ínsitos na ordem urbanística, vez que .não basta à conflagrada realidade habitacional do país um conceito meramente jurídico de moradia. (BOHRER e CABISTANI, 2007, p.59)

 

Importante destacar que há uma diferença entre moradia e habitação e que para a maioria das pessoas são sinônimos, porém para fins de compreendermos melhor esta subjetividade anteriormente citada, acreditamos que uma diferenciação básica é de grande valia e sobre esta diferença destacamos explicação de Rosa e Gorczevski: “Conceituar habitação e moradia faz-se necessário devido ao caráter da função social, ou seja, a habitação pode ter caráter temporário, sem atender a função social, já a moradia é exercida de forma definitiva e atendendo a função social”. (2002, p. 8).

Podemos afirmar sem receios que o direito a moradia é mais que um direito social, sendo com certeza um direito fundamental, e o fazemos com base na posição dos autores da proposta que culminou com a edição da Emenda 26/2000, explicitado por De Carli:

Nesse contexto, a moradia, embora seja comumente alçada ao patamar de direito social, na verdade, consubstancia atributo essencial da personalidade, pois é no locus doméstico que as pessoas desenvolvem seu caráter, dão os primeiros passos rumo ao processo de crescimento espiritual, físico e intelectual. (DE CARLI, 2009, p. 11).

 

Assim sendo, direito à moradia e dignidade da pessoa humana estão intimamente ligadas, não havendo como pensar na concretização deste, sem a efetivação daquele, e embora seja um direito de aplicabilidade imediata, o problema da falta de habitação no Brasil e no mundo continua a ser alvo de debate nos encontros e conferências nacionais e mundiais, e em nosso país especificamente, alvo de políticas públicas que buscam soluções através da concretização de princípios e regras vigentes, para solucionar a difícil questão do acesso à moradia.

 

3 Ferramentas de Efetivação Direito Fundamental de Moradia e sua Aplicabilidade.

O acesso a moradia, embora garantido constitucionalmente, continua distante da realidade da maioria dos brasileiros, em embora muitas leis e decretos visando facilitar a aquisição da moradia tenham sido criadas anteriormente a Constituição de 1988, tais como a Lei 4.380/64 que instituiu o Sistema Financeiro da Habitação, vimos que foi apenas na Constituição de 1988 que o direito a moradia adquiriu status de direito fundamental.

Nos artigos 182 e 183, no capítulo II, título VII da CF, logo após o capítulo que trata da Ordem Econômica e Financeira, o legislador dispõe sobre a Política Urbana, delegando ao poder público municipal a função de executar medidas para o desenvolvimento urbano. Visando esclarecer melhor esta opção do legislador, vejamos a colocação de Cammarosano:

 

À primeira vista pode até parecer estranho que disposições concernentes à política urbana estejam inseridas, na Constituição, logo em seguida às relativas aos princípios gerais da atividade econômica. Não obstante, está arrolado dentre os mencionados princípios, o da função social da propriedade, que, em sendo urbana, só é cumprida, quando atende às exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor (CF, art. 182). (2003, p. 22).

 

O capítulo II da CF fornece em linhas gerais as ferramentas básicas para que o estado cumpra seu dever no que diz respeito à questão da moradia, visto que a exigência do cumprimento da função social da propriedade é ponto de partida para a ampliação de tal discussão, e possível solução para o problema. Nasce o plano diretor como uma destas importantes ferramentas, visto que por se tratar de um instrumento especificamente regional, já que compete aos municípios elaborarem seus planos com a realidade de cada região, de cada município. Nesse sentido, Prestes nos traz a seguinte afirmação: “O Plano Diretor, portanto mais do que um ordenador físico-territorial, é instrumento de gestão e prospecção das cidades, a partir da pluralidade e das necessidades existentes no território”. (2008, p. 36)

O Plano Diretor nos moldes constitucionais, trata-se de um instrumento legal que tem por objetivo implementar a política de regularização fundiária, proporcionando o desenvolvimento urbano, a partir do pequeno núcleo, o Município, através da fixação de metas a serem cumpridas em um tempo determinado, metas que abrangem conteúdo social, econômico, urbanístico e ambiental.

É a chamada Política Urbana cujo conceito nos traz Gasparini:

 

Tendo em vista o instituído e regulado pela Lei de Responsabilidade Social,  pode-se afirmar que política urbana é o conjunto de intervenções municipais legais e materiais e de medidas materiais interventivas no espaço urbano promovidas por terceiros coordenados pelo Município, visando aquelas e estas ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e da propriedade urbana. (GASPARINI, 2002, p. 5).

 

O Brasil tem agora uma Política Urbana definida em sua lei maior, pelo menos tem orientações para a implementação de uma Política Urbana, porém, faltam as “diretrizes gerais fixadas em lei”, mencionadas no caput do artigo 182, mas somente treze anos após a promulgação da CF é que o capítulo da Política Urbana foi regulamentado pela Lei 10.257/2001, o chamado Estatuto da Cidade, mais uma ferramenta do Estado em busca da efetivação do direito a moradia, sobre o qual trazemos o seguinte:

 

Entretanto, carecendo o texto constitucional de normatização suficiente para a consecução para a consecução das finalidades para as quais aponta, e postulando expressamente uma produção normativa infraconstitucional, eis que vem a lume a Lei 10.257, de 10.7.2001, assinalando em seu “Preâmbulo” que “regulamenta os arts. 182 e 183 da Constituição Federal, estabelece diretrizes gerais da Política Urbana e dá outras providências”. (CAMMAROSANO, 2002, p. 23).

 

O Estatuto da Cidade surge como resultado de uma intensa movimentação política e social, com o intuito de regular as normas constitucionais sobre a política urbana implementando institutos e regras facilitando assim a efetividade das normas e alterando a visão elitista da propriedade urbana nas cidades brasileiras, fazendo com que o direito à moradia passe a integrar definitivamente as funções das cidades.

A lei 10.257/2001 traz diretrizes e normas gerais de direito urbanístico dispõe sobre institutos de direito civil e administrativo pertinentes a propriedade e prevendo novos institutos para a efetivação da regularização fundiária e  do direito à moradia, através da indução ao desenvolvimento urbano, imposição de penas e impostos, e a promoção da política urbana.

Em Julho de 2009, outra ferramenta foi criada, a Lei 11.977, que instituiu o Programa Minha Casa, Minha Vida (PMCMV) do Governo Federal, visando o custeio de moradia à população de baixa renda e a promoção da Regularização Fundiária, estabelecendo novos conceitos, critérios e limites, e complementando alguns aspectos do estabelecido no Estatuto da Cidade.

Desde muito o Estado vem procurando cumprir seu dever no que se refere ao direito à moradia, e mesmo que na maioria das vezes as medidas tomadas, as leis criadas, tenham um caráter mais eleitoreiro do que definitivamente o objetivo de resolver a difícil situação das camadas menos favorecidas da população, ainda assim merecem seu crédito visto que muitos brasileiros podem e são beneficiados com tais dispositivos que serão analisados com mais profundidade no próximo capítulo deste trabalho.

 

4 A regularização fundiária, o Estatuto da Cidade e a Lei 11.977/2009

A Constituição federal de 1988 instituiu a política urbana, estabeleceu o plano diretor como instrumento básico da política de desenvolvimento e de expansão urbana (art. 182, § 1º), bem como, estabeleceu o meio de definição para o princípio da função social da propriedade urbana (art. 170), vimos então que “a propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor”, (art. 182, § 2º), porém não é só nesse sentido que a propriedade cumpre a sua função social, quanto a esta afirmação:

 

Mas não é somente com base nessa disposição que a propriedade cumpre sua função social. Cumpre-a, sobretudo, quando atende às camadas da população de baixa renda, pelo menos em termos de possibilidade de uma moradia digna para essa camada. (MUKAI, 2008, p. 89).

 

Com base na definição do § 2º, do art. 182, que encontramos o possível significado da expressão “regularização fundiária”, que podemos definir então como sendo o conjunto de medidas políticas, jurídicas, e social, que visam a regularização do imóvel, para que este cumpra seu fim, promovendo a efetiva observância da função social da propriedade urbana, é a reorganização dos centros urbanos, promovendo a infra-estrutura e o desenvolvimento.

A realidade da formação de nossas cidades, principalmente no que diz respeito as grandes cidades e regiões metropolitanas, é a que presenciamos desde os anos oitenta com o crescimento do êxodo rural, o conseqüente avanço das ocupações desorganizadas, na maioria das vezes de forma clandestina e consequentemente irregulares, que transformaram grandes glebas em novos bairros, que sob a forma de loteamentos surgem com inúmeras deficiências, impossibilitando o pleno desenvolvimento social daqueles que ali habitam.

 

E é aqui que o Estatuto da Cidade entra como ferramenta hábil para a implementação do direito a moradia, pois visando a aplicação do instituído pela CF em seu art. 183, da Usucapião urbana, criou dois institutos muito importantes, quais sejam, a usucapião especial urbana, nos artigos 9º a 14, e a concessão especial para fins de moradia, nos artigos 15 a 20, estes, porém foram vetados sob alegação de que não foi fixado limite para a aquisição da concessão de uso especial, o que estimularia a continuidade das invasões (Mukai, 2008), entre outros motivos.

No que se refere a  concessão especial para fins de moradia, foi posteriormente tratada na Medida Provisória 2.220/2001, sobre o que se manifesta Di Pietro:

 

A disciplina da matéria na Medida provisória 2.220 é muito parecida com a que se continha nos arts. 15 a 20 do Estatuto da Cidade, limitando-se a corrigir as falhas apontadas no veto e acrescentando um dispositivo para deixar expresso que o mesmo direito à concessão pode ser exercido em relação a imóveis públicos da União, Estados, distrito Federal e Municípios, além disso foi prevista a possibilidade de autorização de uso de imóveis públicos para fins comerciais. (DI PIETRO, 2003, p. 155).

 

 O Estatuto da Cidade alterou também dispositivos da Lei de Registros Públicos, 6.015/73, e no que diz respeito a concessão de uso especial a alteração ao artigo 167, I, da Lei 6.015/73, alterado pela MP 2.220/2001, passa a ser obrigatório apenas o registro dos termos administrativos ou das sentenças declaratórias de concessão de uso especial para fins de moradia., sendo que em se extinguindo o direito, deverá este ser averbado no registro de imóveis conforme art. 162, II, item 2, da Lei 6.015/73.

Quanto a usucapião especial urbana, regulamentada pelo Estatuto da Cidade, podemos verificar que o art. 9º ratifica de forma literal o exposto no art. 183 da CF, inova o Estatuto no § 3º que permite a continuação da contagem do prazo ad usucapionem, pelo herdeiro legítimo que sucede na posse o antigo possuidor.

Outra importante inovação do Estatuto da Cidade é a criação das Zonas Especiais de Interesse Social – ZEIS, através deste instrumento é possível delimitar  determinadas áreas do Município para a criação de moradias populares, permitindo assim a implantação de habitação de interesse social, cumprindo o objetivo da política urbana descrita no art. 2º, inciso XIV.

 

Art. 2º A política urbana tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e da propriedade urbana, mediante as seguintes diretirzes gerais:

...

XIV – regularização fundiária e urbanização de áreas ocupadas por população de baixa renda mediante o estabelecimento de normas especiais de urbanização, uso e ocupação do solo e edificação, consideradas a situação socioeconômica da população e as normas ambientais;

 

Embora tenha o Estatuto da Cidade trazido todas às inovações anteriormente descritas, a realidade desde sua promulgação até os dias atuais continua sendo a mesma de dez anos atrás, e embora nosso país tenha experimentado um grande desenvolvimento as condições de sub moradia ainda persistem, bem como a falta de implementação das políticas já existentes

Buscando finalmente solucionar a questão pertinente a regularização fundiária nos centros urbanos em 25 de março de 2009 é editada a medida provisória 459, convertida em lei, transformando-se na Lei 11.977 de julho de 2009.

A lei 11.977/2009 além de instituir a regularização fundiária, instituiu também o Programa Minha Casa, Minha vida – PMCMV, que tem por objetivo facilitar o acesso da população de baixa renda à aquisição da casa própria, estabelecendo incentivos e custeios facilitadores, integrando juntamente com a regularização fundiária acesso a propriedade. Em notícia divulgada pelo Ministério das Cidades sobre a Lei 11.977, foi apresentada a seguinte definição quanto a sua criação e objetivos:

 

A nova lei se divide em três partes. A primeira refere-se diretamente ao Programa Minha Casa, Minha Vida – PMCMV, cujo objetivo é criar uma série de mecanismos para produção, aquisição e reforma de unidades habitacionais de interesse social. A segunda parte trata do registro eletrônico de imóveis, que possibilitará a formação de um banco de dados nacional com os atos registrais praticados antes e depois da vigência da Lei de Registros Públicos 6.015/73. Também nela foi instituída a gratuidade do registro do primeiro imóvel residencial adquirido no âmbito do PMCMV, cujo beneficiário tenha renda familiar mensal de até três salários mínimos. A terceira parte define conceitos, regras, procedimentos de âmbito federal para a promoção da regularização fundiária de assentamentos urbanos, sendo este o primeiro marco legal de alcance nacional a tratar especificamente dessa matéria, introduzindo novos instrumentos para legalizar milhões de moradias urbanas no País. (Ministério das Cidades, 2009)

 

As alterações trazidas pela Lei 11.977/2009 foram várias e de caráter importante, alterou o Decreto-Lei 3.365/1941, as Leis 4.380/64, 6015/73 (Lei dos Registro Públicos). 8.036/90, o próprio Estatuto da Cidade, bem como a Medida Provisória 2.197-43/01, que alterou as leis que regulamentam o Sistema Financeiro da Habitação, e todas estas alterações e regulamentações também vieram acompanhadas de inovações que se bem aplicadas e direcionadas poderão resolver em grande parte a questão do acesso a moradia no Brasil, uma vez que se uniram em um único dispositivo legal critérios variados.

É no Capítulo III da Lei, que encontramos o conceito de regularização cuja definição trazemos a seguir:

 

Art. 46. A regularização fundiária consiste no conjunto de medidas jurídicas, urbanísticas, ambientais e sociais que visam à regularização de assentamentos irregulares e à titulação de seus ocupantes, de modo a garantir o direito social à moradia, o pleno desenvolvimento das funções sociais da propriedade urbana e o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado.

 

Fica claro que as medidas de regularização fundiária objetivam garantir a efetivação do direito à moradia, tais medidas implicam na aplicação de ações oriundas das mais diversas áreas de conhecimento, mas principalmente de organização e vontade política.

Além desta importante definição, a lei também traz definições para área urbana consolidada (art. 47, II), uma nova definição para as ZEIS (art. 47, V), a abrangência da regularização fundiária, bem como a divide em duas espécies, a regularização fundiária de interesse social e a de interesse específico, autoriza os Municípios a legislarem sobre a regularização fundiária e legitima diversos entes que não somente o poder público a promover a regularização fundiária, definindo inclusive as características do projeto de regularização fundiária (art. 50 e incisos), a regularização de loteamentos, além de muitas outras alterações que vem a facilitar e desburocratizar o processo de regularização fundiária, inclusive no que diz respeito à questão registral.

Há muito ainda à ser analisado quanto a Lei 11.977/2009, o que fizemos foi apenas destacar alguns pontos importantes deste dispositivo que juntamente com o Estatuto da Cidade são ferramentas completas para a implementação da regularização fundiária, bastando apenas interesse público e vontade política.

 

5 Considerações Finais

Após breve analise percebemos que desde a promulgação da Constituição Federal até os dias atuais, o direito a moradia, embora ligado ao princípio da dignidade da pessoa humana, ainda não é tratado como tal.

O reconhecimento de sua importância para o homem enquanto individuo, embora expresso na Carta Magna, entre os princípios que regem um Estado Democrático de Direito, ainda não encontrou meios suficientes de defesa e implementação. Ao folhearmos a Constituição e mesmo sem uma análise mais profunda, podemos observar que se a mesma se resumisse apenas aos dois primeiros capítulos, e se tivéssemos a observância efetiva de todos os direitos e deveres ali elencados, os fundamentos de um Estado Democrático de Direito, seriam, sem grande esforço concretizado, porém há muito ainda que se aprender e principalmente fazer no que se refere aos direitos ali consagrados.

Na luta pela efetivação do direito à moradia, merece destaque a importante ação de grupos e movimentos que amparados pela proteção dispensada à eles pela Carta Magna, buscam através de uma atuação mais enérgica soluções por parte do Estado, embora muitas vezes suas atuações sejam mal organizadas o que por vezes vem a desmerecer os objetivos de sua luta, ainda assim merecem seu crédito visto que muitos brasileiros podem e são beneficiados, direta ou indiretamente, pelos resultados desta busca incessante pelo mínimo necessário, porém muito importante ao desenvolvimento do ser humano, enquanto indivíduo inserido em uma sociedade.

Todavia, não podemos negar que muito já foi feito, e que o Estado vem procurando cumprir seu dever no que se refere ao direito à moradia, mesmo que na maioria das vezes, as medidas tomadas, as leis criadas, tenham um caráter mais político do que definitivamente o objetivo de resolver a difícil situação das camadas menos favorecidas da população, e a situação irregular dos centros urbanos.

Assim a partir da edição da Lei 11.977/2009 surgiu uma nova esperança na busca pela efetivação de tão importante direito, bastando que para isso as partes envolvidas atuem no sentido de fazer com que as ferramentas que temos a disposição funcionem e assim possamos um dia sentir orgulho ao andar pelas ruas das cidades, não apenas por sua organização e progresso, mas para que possamos dizer que vivemos realmente em um Estado Democrático de Direito.


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